A psicologia dividiu a inteligência em primária e secundária.
E o que seja a inteligência primária? E a secundária?
A inteligência primária percebe os fenómenos/fenômenos e as relações desses fenómenos (as quais determinam os factos/fatos, sendo que um fenómeno é tudo aquilo que assume a Existência e se distingue nela, enquanto o facto resulta das interações entre os fenómenos), mas candidamente julgando que tais fenómenos e factos sejam efetivamente reais e que sobretudo ocorram tal como são percebidos e depois entendidos por ela. Assim originando um saber fundado em crenças: a crença fundamental de que as realidades sejam mesmo aquelas – e a crença suplementar de que sobretudo elas sejam tal como essa inteligência primária as percebe e entende. Ela esbarra na aparência das coisas e dos acontecimentos, satisfazendo-se com a sua ignorância inocente, incapaz que se mostra de ir mais além e por fim perceber o verdadeiro por quê e o como das realidades e do mundo que essas realidades constroem. É, por isso, uma inteligência de fachada. Que se detém e se fica ao nível das coisas que nos surgem pela frente. Assim se tratando de uma pseudointeligência.
Quantas vezes não passamos por cenários familiares e de repente damos por nós a descobrir pormenores/detalhes que nunca neles havíamos reparados antes?! Porque a nossa (preguiçosa) atenção ficava incidente sempre nos mesmos aspetos. Tornando viciada a nossa perspetiva. E por isso, deficitária também.
Os antigos gregos (…da escola eleática) distinguiram, com precisão, entre o que, parecendo, todavia não É, distintamente daquilo que realmente seja, portanto.
Mas o que é o Ser? Qual será o Ser das coisas, o ser de cada realidade do mundo e de cada realidade que ocorra ao nosso intelecto, seja palpável ou apenas imaginária? Quando é que se poderá dizer, acerca de uma realidade qualquer, que ela (realmente) «seja»?
O Ser é a Verdade. E por quê? Porque a verdade se trata daquilo que É. O seu contrário (aquilo que não é) é a mentira. É a ilusão. E quando nos estivermos a referir a factos (acontecimentos que se verificaram), então dizemos que «verdade foi aquilo que realmente aconteceu». Isto é: uma realidade só será verdadeiramente real, quando ela permanecer ao longo do Tempo. Na nossa memória, por exemplo. Porém não bastando que permaneça: será necessário que permaneça… inalterável. Imutável. Mas absolutamente. Ou seja: amanhã deverá ser EXATAMENTE como se mostra hoje – assim o fazendo de uma maneira inalterável. Até no mais ínfimo detalhe! Pois aquilo que hoje se apresente de um modo e amanhã se revele de um modo distinto do anterior já não será rigorosamente a mesma realidade!
E aqui reside a distinção fundamental entre a inteligência primária e a secundária, paralela à distinção outra entre essência (ou Verdade) e aparência (ou Ilusão). Pois a inteligência secundária ultrapassa a barreira da aparência e penetra o domínio da Essência, vislumbrando a dimensão da Verdade. Que, para ser realmente Vista, para ser entendida, todavia requererá outros olhos, exigindo uma diferente capacidade de entendimento, nomeadamente aquela que, liberta das ilusões que intrujam os olhos que somente veem a Aparência, consiga, por uma espécie de radioscopia intelectual, perceber os contornos de uma realidade mais plena, que o olhar prisioneiro não abarca.
E a realidade mais plena dentre todas as realidades é precisamente aquela a que o equatoriano Yaguana Zhuma, afinal na esteira dos antigos gregos pré-socráticos (Empédocles, sobretudo), identifica como sendo a Divindade: «Amor puro e infinito», no seu próprio dizer (e que corresponde à categoria do simples «Amor» na dualidade «Amor»—«Ódio» de Empédocles). O que equivale a dizer que só conseguirá Ver além aquele que vir… com amor. Pois só a Visão com amor permite compreender plenamente uma realidade qualquer em todas as suas inerências estruturais e em todas as suas implicações relacionais, uma vez que a Visão neutra, desinteressada, desapegada, no sentido de ser indiferente, não é senão a visão meramente científica acerca da realidade e não a visão sábia. Isto é (e em resumo): o Amor é a Sabedoria. Porque só conhece verdadeiramente, só conhece plenamente, quem consiga penetrar as coisas, penetrar o espírito das coisas, a fim de as poder conhecer por dentro, de as conseguir conhecer essencialmente. De contrário, ter-se-á apenas uma imagem, uma informação, acerca do alheio. E uma imagem é sempre uma ilusão, quanto mais não seja devido ao facto de a imagem não refletir senão um momento na existência das coisas. Refletindo-as diferentemente momentos após, ainda que isso só se torne notável bastante tempo transcorrido. Pois a imagem reflete o instante de cada fluxo. Retrata a fugacidade do momento que passa – e que não volta mais enquanto coisa que transitou para outra instância. Sendo a Natureza nada mais do que fluxo, transição, fuga. Eco de um sopro inaudível. Que a música humana busca desesperadamente encontrar e conhecer de acorde em acorde, de simulação em simulação.
Quem não ama, nem sequer se interessa em saber da existência daquilo que não ama. Quanto mais conhecê-lo! Por isso é que a Sabedoria e o Amor coincidem. E é por isso que a divindade, sendo onisciente, é Amor por inerência. Como Yaguana Zhuma percebeu.
EV,
08-09-2017.